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São Paulo, SP, Brazil
Uma deficiente visual (Retinose Pigmentar), que vê a vida, como um presente à ser desfrutado.

quarta-feira, 25 de novembro de 2015

A vida por 1 ponto de vista - Cap IX - 2ª Parte


Nancy – 2ª Parte

 

Uma vez, resolvemos pegar o sol da tarde, na praia de Barequeçaba, em São Sebastião.

Quando ela parou o carro, desci conversando com ela, olhando sobre o carro, e com um passo atrás... Caí em uma canaleta construída entre a calçada e a guia.

A Nancy me viu, simplesmente sumir diante dos seus olhos, e eu, ainda tive sorte de cair com uma das pernas dobradas, que fez com que eu não entrasse com o corpo todo naquele buraco.

Uma verdadeira armadilha para deficientes.

Outra vez, fomos ao centro da cidade para comprar um maiô.

Como sempre, apenas mencionei que estava precisando comprar um maiô, e ela logo se prontificou em me levar:

— Vi uns modelos lindos, lá no centro de São Sebastião... Se você quiser, podemos ir até lá, depois do almoço...

Nos arrumamos e fomos às compras.

Ela parou em frente uma loja de moda, e eu percebi que tinha uma vitrine.

Desci do carro, e fui andando em direção á loja, e ela me disse, aflita:

— Não, Sil! Aí, não! Vamos atravessar a avenida...

Ela me estendeu a mão, e pequei em seu braço para atravessarmos a avenida.

Descemos a guia e percebi que tinha faixa de pedestres. Ouvi uma moça no carro que passou bem perto  da gente, falando qualquer coisa, alto, beio brava...

Enquanto atravessávamos a avenida, perguntei:

— Aquela moça estava falando com a gente?

— Ahn...? moça...?Que moça? — ela falou distraída...

— A moça do carro... — eu disse, começando a perceber que ela, desligada, nem tinha percebido nada.

— Ahn...? Carro...? Que carro...?

Chegando do outro lado da rua, ela me falou:

— Levanta! Levanta!

Eu não sabia do que ela estava falando.

— Levanta o que, Nan?

— Levanta o pé, para subir na calçada!

Era óbvio. EU é que não estava na sintonia dela, claro?

Nesse momento, senti com meu pé, a guia rente a calçada, e subi logo atrás dela.

O deficiente sempre está à um passo atrás, para que a gente sinta de o acompanhante para, sobe ou desce um degrau...

Um guarda veio ao nosso encontro e perguntou:

— Vocês não viram o semáforo?

A Nancy olhou para ele, como se ele tivesse falando outro idioma:

— Ahn...? Semáforo...? Que semáforo...? — ela perguntou.

— Este aqui. — Falou o guarda, olhando para o alto do poste, com toda a paciência do mundo — Estava vermelho pra vocês.

Então me lembrei:

— Ai, Nancy, por isso que a moça passou xingando... Ela estava falando com a gente!

Caímos na risada, agradecendo e nos desculpando com o guarda.

Chegamos na loja, ainda rindo da situação, e ela me ajudou a escolher um maiô lindo: preto, com um recorte pequeno no busto de uma estampa floral, bem delicada e um zíper no decote.

Desde quando eu era , pequena, quando ela inventava estórias para nos contar, a Nancy fazia, e ainda faz, com que eu sinte, que todos os momentos que passamos juntas, se tornem especiais.

Parece que me leva para outro planeta, onde tudo é bonito, colorido, perfumado e bom.

 

segunda-feira, 23 de novembro de 2015

A vida por 1 ponto de vista - Cap IX - 1ª Parte


Nancy - 1ª Parte


Não sei bem se ela é minha prima...
Para mim, é minha irmã.
Irmã de sangue...
Irmã de alma...
É uma sábia; que pra gente parece que vai para outra dimensão com mais facilidade do que qualquer monge tibetano com prática em meditação em alcançar o Nirvana em poucos segundos...
Fico impressionada com a capacidade que tem em me surpreender, com seu jeito displicente, natural, e com tanta sabedoria, me deixando grandes ensinamentos.
Não só pelo seu jeito de ver o mundo, por tudo que compartilhamos...
Não só por morarmos tão próximas, mas pela simples e tão importante, afinidade.
Quando não passávamos as férias todas juntas, na casa de praia dos seus pais, em São Francisco da Praia (São Sebastião), a gente sempre dava um jeito de passar ao menos alguns dias, juntas.
Assim como convivemos naturalmente com a deficiência física do seu irmão, Eloy, eles também encaravam com naturalidade a baixa visão do meu irmão e a minha.
Nós compartilhavamos tudo, e quando ela aprendeu a dirigir, ensinou a gente, também.
Eu, mal conseguia alcançar os pedais da  Kombi, do meu tio, e mesmo assim, ela não pestanejou quando pedi para tentar, depois do meu irmão.
Um bom argumento, para meus pais que souberam só quando voltamos da aula de direção, foi:
—E se alguém passa mal dirigindo...? — falei, com segurança— Preciso, no mínimo, saber enconstar o carro em um lugar seguro, para esperar ajuda...
Acho que, ao longo da minha vida, fui desenvolvendo a capacidade de argumentar e a perseverar, diante das adversidades.
Fui me tornando mais determinada e considerando a perseverança um caminho natural para alcançar meus objetivos.
Também desenvolvi um bom senso de orientação;  todas as vezes que saímos juntas, ela me pergunta qual o melhor caminho. Eu vou indicando, e ela segue com a maior segurança, pois, na grande maioria das vezes, eu acerto.
Meu marido, quando nos conhecemos, achou isto tão inacreditável, que quando eu fui ensinar o caminho para a minha casa, ele  não confiou, e se perdeu.
Já tinha escurecido.
Ele resolveu voltar atrás e seguir minhas orientações, e só assim, deu tudo certo.
Muita gente hoje em dia, se admira ao saber que eu aprendi a dirigir.
Uma vez, pedi a um namorado, para me dar uma prova de confiança, e me deixar dirigir na serrinha que fica entre São Sebastião e Caraguatatuba.
Ainda por cima, cruzamos com um carro da polícia rodoviária, que diminuiu a velocidade, e desconfiada, quase retornou atrás de nós.
Eu continuei, firme, demonstrando confiança, e eles seguiram seu caminho.
Quando chegamos na casa de Caraguá, meu namorado estava com uma enxaqueca que durou dois dias!!!
Ninguém ficou sabendo o motivo...
Outro dia, minha amiga Lena, me deu outra prova de confiança: eu disse que tinha sonhado que não sabia mais dirigir, e gostaria de tentar, novamente, e ela me ofereceu seu carro (novinho!), para que eu tentasse e tirasse essa dúvida.
E as lições da Nancy, voltaram nitidamente e eu fiz tudo direitinho!
Muitas vezes, percebo que nem as pessoas que convivem comigo, tem a noção exata de como eu enxergo.
Talvez, nem eu mesma, já que o quadro vem se agravando e quando me dou conta, não consigo mais ler ou fazer algum trabalho manual, com a facilidade de antes.
Ao contrário. A dificuldade é surpreendente.
Por isso estava lembrando de duas coisas que aconteceram quando eu estava com a Nancy, dentre milhares de outras.

(Continua no próximo post)

Reflexões

Para cima, e para o alto!



Se um dia, menino

A vida lhe pega

Andando sem tino

Caindo na pedra



Não fica, menino

Por causa da pedra

Como o corpo fechado

Com um corpo de pedra



Um dia essa pedra

Com mêdo de alguém

Com o corpo em queda

Pode ir além

De um poço sem fim



Não fica, menino

Por causa da pedra

Com o corpo fechado

Com um corpo de pedra



Silvann@____